O governo federal encaminhará ao Congresso Nacional um projeto de lei que prevê o endurecimento das penas para crimes relacionados à receptação de celulares, dispositivos eletrônicos, cabos e fios, além de itens como medicamentos, combustíveis, fertilizantes, minérios, armas e veículos. De acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), o objetivo da proposta é coibir o mercado ilegal e desarticular quadrilhas que lucram com a revenda de produtos roubados.
O projeto de lei também propõe a criação de um novo tipo penal: o furto qualificado por encomenda para fins comerciais. A prática, segundo o governo, se tornou comum em organizações criminosas que agem sob demanda para abastecer mercados ilegais — tanto presenciais quanto virtuais.
Além disso, a comercialização irregular de sinal de televisão por assinatura, conhecida popularmente como “gatonet” ou “TV box”, será equiparada ao crime de receptação qualificada. A medida visa combater o desvio de sinais audiovisuais e a concorrência desleal enfrentada pelas operadoras legalizadas.
Punições mais severas
Caso seja aprovado, o projeto prevê aumentos significativos nas penas para quem compra, vende, transporta ou de qualquer forma utiliza produtos de origem criminosa. No caso de receptação para fins comerciais ou industriais, especialmente envolvendo dispositivos eletrônicos e equipamentos de telecomunicações, a pena mínima, hoje fixada em 3 anos de reclusão, poderá subir para 4 ou até 4 anos e meio. Já a pena máxima poderá saltar de 8 para 10 anos e 6 meses, ou até mesmo 12 anos, dependendo da gravidade do caso.
A proposta também endurece a punição para receptação de itens com alto valor agregado ou risco à saúde e segurança pública, como medicamentos, combustíveis, fertilizantes e minérios. Também entram na lista cabos de energia, dispositivos que armazenam dados pessoais e mercadorias transportadas por empresas de logística ou Correios.
Brecha familiar será fechada
O texto legislativo proposto pelo MJSP também fecha uma lacuna da atual legislação penal brasileira: a isenção de pena para quem adquire produtos roubados de familiares. Hoje, é comum que esse tipo de conduta não seja punida, mesmo quando feita com plena ciência da origem ilícita do bem. Com a nova regra, parentes também poderão ser responsabilizados criminalmente, caso se beneficiem de produtos provenientes de furto ou roubo.
Pirataria digital no alvo
A comercialização de dispositivos não homologados, como os aparelhos TV box piratas, será considerada crime grave. Esses equipamentos, usados para acessar ilegalmente sinais de televisão por assinatura, serão enquadrados como receptação qualificada, o que pode resultar em pena de reclusão mais severa.
“A venda de produtos roubados — incluindo serviços ilegais, como os chamados gatonet e os aparelhos TV box piratas — também será enquadrada como crime grave”, informou o MJSP por meio de nota. O ministério destaca que o novo tipo penal é necessário, já que a jurisprudência atual não permite a aplicação da lei de furto de energia elétrica nesses casos.
Segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que tem intensificado a fiscalização sobre equipamentos irregulares, mais de 1,6 milhão de itens foram retirados do mercado desde 2023, representando um prejuízo de R$ 253 milhões para o comércio ilegal. A operação tem como objetivo garantir o uso de produtos que sigam os padrões técnicos e de segurança exigidos no país.
Novo cenário penal
O projeto de lei apresentado pelo governo faz parte de um esforço mais amplo para combater a receptação como elo fundamental da cadeia do crime patrimonial. Ao punir de forma mais rigorosa não apenas quem pratica o furto ou roubo, mas também quem se beneficia desses atos, a proposta visa interromper o ciclo de lucro fácil sustentado pelo mercado paralelo.
“Se o projeto for aprovado, passará a ser crime grave furtar algo para vender depois, especialmente se for feito como parte de um negócio, seja legal ou ilegal”, reforça o texto do Ministério da Justiça.
Além das penas ampliadas e da criação do novo tipo penal, o texto também deixa claro que qualquer pessoa que adquire, transporta, oculta, vende ou até mesmo presta serviço com produtos oriundos de crime poderá ser enquadrada no novo crime de receptação qualificada.
Tramitação
O texto será enviado ao Congresso Nacional e dependerá de aprovação nas duas casas legislativas para entrar em vigor. A expectativa do Ministério da Justiça é de que a proposta seja debatida ainda no primeiro semestre de 2025, dentro da agenda de segurança pública articulada pelo governo federal.
Caso aprovada, a nova legislação poderá representar um marco no combate ao crime patrimonial, especialmente no que diz respeito ao furto de celulares, roubo de cargas e pirataria digital — crimes que têm impacto direto no cotidiano de milhões de brasileiros e também no funcionamento de setores econômicos estratégicos.
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Fonte: Agência Brasil
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil