A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou nesta segunda-feira (14) o primeiro registro definitivo de uma vacina contra a chikungunya no Brasil. O imunizante é fruto da parceria entre o Instituto Butantan, vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, e a farmacêutica franco-austríaca Valneva. Com a aprovação, a vacina está liberada para aplicação em adultos a partir dos 18 anos em todo o país.
A autorização representa um marco na saúde pública brasileira e internacional. Esta é a primeira vacina contra a chikungunya aprovada no mundo e seu registro foi baseado, de forma inédita, na resposta imunológica observada em estudos clínicos, ao invés de testes de eficácia tradicionais. A estratégia foi necessária devido à baixa circulação do vírus em algumas regiões, o que dificulta ensaios clínicos comparativos.
Alta eficácia e segurança comprovadas em estudos internacionais
O imunizante foi testado em um estudo clínico com 4 mil voluntários de 18 a 65 anos nos Estados Unidos. De acordo com os resultados, publicados em junho de 2023 na revista científica The Lancet, 98,9% dos participantes produziram anticorpos neutralizantes contra o vírus da chikungunya. Esses anticorpos permaneceram em níveis elevados por ao menos seis meses após a aplicação da vacina, demonstrando alta imunogenicidade e durabilidade da resposta imune.
Nos testes realizados no Brasil, em adolescentes, a eficácia também foi promissora. Segundo estudo publicado em setembro de 2024 na The Lancet Infectious Diseases, uma única dose da vacina induziu a formação de anticorpos em 100% dos jovens com infecção prévia e em 98,8% dos que nunca haviam sido expostos ao vírus. Após seis meses, 99,1% dos voluntários ainda apresentavam proteção.
Os eventos adversos registrados foram, em sua maioria, leves ou moderados. Os mais comuns incluíram dor de cabeça, dor no corpo, fadiga e febre – reações típicas esperadas após a aplicação de vacinas.
Vacina já é aprovada nos Estados Unidos e na Europa
Antes da autorização no Brasil, a vacina já havia sido aprovada por duas das principais agências reguladoras do mundo: a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, e a European Medicines Agency (EMA), na União Europeia. Esses órgãos também validaram os resultados com base na resposta imunológica, reforçando a solidez dos dados apresentados.
A aprovação da Anvisa é válida para a versão do imunizante desenvolvida pela farmacêutica Valneva, mas também acelera o processo de análise da vacina produzida pelo Instituto Butantan, que tem formulação praticamente idêntica.
Produção nacional e possível inclusão no SUS
Atualmente, o Instituto Butantan trabalha em uma versão própria da vacina, com parte do processo de produção realizada no Brasil e uso de insumos nacionais. Essa versão está em fase de avaliação e poderá ser incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS) após análise da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), do Programa Nacional de Imunizações e de outras autoridades sanitárias.
“A partir da aprovação pelo CONITEC, a vacina poderá ser fornecida estrategicamente. No caso da chikungunya é possível que o plano do Ministério seja vacinar primeiro os residentes de regiões endêmicas, ou seja, que concentram mais casos”, explica o diretor do Instituto Butantan, Esper Kallás.
Chikungunya: números crescentes e impacto na saúde
Transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti, a chikungunya é uma doença viral que provoca febre alta, dores intensas nas articulações e, em muitos casos, evolução para dor crônica. Em 2024, a doença afetou mais de 620 mil pessoas em todo o mundo, com Brasil, Paraguai, Argentina e Bolívia liderando o número de casos.
Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil registrou 267 mil casos prováveis da doença e pelo menos 213 mortes somente em 2024. O impacto na qualidade de vida dos pacientes é significativo, especialmente nos casos em que as dores articulares persistem por meses ou até anos.
Controle do vetor continua essencial
Apesar da chegada da vacina, as autoridades reforçam que o controle do mosquito transmissor continua sendo uma das principais estratégias de prevenção. Medidas simples como evitar o acúmulo de água parada em vasos de plantas, pneus, garrafas e outros recipientes ainda são fundamentais para conter a disseminação do Aedes aegypti.
Até o momento, não existe um tratamento específico para a chikungunya. O manejo da doença é feito por meio do controle dos sintomas, principalmente com o uso de analgésicos e anti-inflamatórios.
Um marco na ciência brasileira
A aprovação do imunizante é celebrada como um passo importante na soberania científica e tecnológica do Brasil. Ao lado de parceiros internacionais, o Instituto Butantan consolida sua posição como referência na produção de vacinas voltadas à saúde pública.
O modelo de aprovação baseado em resposta imunológica abre novas possibilidades para o desenvolvimento de vacinas contra outras doenças com baixa circulação, mas alto potencial de impacto.
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*Com informações: Agência SP